quarta-feira, 23 de abril de 2008

A humanidade de um homem só

*Resenha do filme O Pagador de Promessas (Ficha Técnica na Wikipédia)*

O Pagador de Promessas é um clássico que merece ser tratado como tal

A Palma de Ouro conquistada por O Pagador de Promessas, em 1962, não foi um prêmio apenas pro cinema nacional. Foi uma vitória pra toda produção cultural do país, em especial a literatura. Pois, em se tratando dela, O Pagador de Promessas remete a grandes nomes. O início do filme já lembra a aridez de Graciliano Ramos: o trajeto no qual um homem carrega uma cruz é alçado a epopéia devido à trilha sonora magnânima e às tomadas incomuns para a época.

O tempo, aliás, é um dos fatores que dá o tom do conflito no filme. Acompanhado unicamente por sua esposa, Zé-do-Burro carrega uma cruz até a Igreja de Santa Bárbara, a fim de pagar uma promessa. Os dois se vêem numa Salvador com automóveis, jornais, pessoas de todos os tipos e interesses — algo que vai além da vida no sertão trespassada na atuação da dupla Leonardo Villar (Zé-do-Burro) e Rosa (Glória Menezes). A Salvador de O Pagador de Promessas pode ser moderna, mas, até certo ponto, conserva seu ar colonial. Foi lá onde viveu e escreveu o Boca do Inferno. É lá onde ainda há espaço para o escárnio e a sátira. Todo um cenário de Gregório de Mattos é retratado: os aproveitadores e malandros que surgem em cada degrau da escadaria da Igreja; as autoridades, que são vistas simultaneamente com maus olhos e temeridade (aí também um quê de Graciliano Ramos); o sincretismo religioso, que pulula em cada seqüência — para Zé-do-Burro, Iansã é Santa Bárbara.

A película, originalmente uma peça, parece ter sido muito bem adaptada até metade de sua projeção. Após, isso, contudo, a linguagem cinematográfica por vezes é prejudicada em detrimento às características da peça. Os personagens surgem e reaparecem sem continuidade, a trama torna-se muito dedutiva. Felizmente, a ótica do cinema prevalece nos planos. O diretor, Anselmo Duarte, aproveita bem o cenário sem torna-lo constante. Cada cena tem uma apreensão diferente, seja no movimento da câmera ou em takes estáticos.

Em uma dessas cenas, Zé-do-Burro sobe a escadaria junto do padre, dialogando longamente sobre a promessa. O padre, como outros personagens do filme, quase não é nomeado. É um artifício antigo, mas eficiente a fim de transpor o regional a um âmbito global. Os tipos soteropolitanos tem resquícios da humanidade, assim como se faz na literatura de cordel, vertente tipicamente nordestina. Aproveitar esse aspecto foi uma idéia de Dias Gomes, mas muito bem aproveitada aqui, o que não ocorre sempre. É o caso do filme Alto da Compadecida, peça escrita por Ariano Suassuna. Nela, a figura do nordestino João-Grilo, quando retratada na película, cai no estereótipo.



O esterótipo e o paradigma são características que também aparecem em O Pagador de Promessas. Não se pode acusar o filme, contudo, de cair no comum. A cena final é quase super-realismo. Ali a projeção se amarra a Guimarães Rosa, mas, principalmente, ao livro mais antigo do mundo: a Bíblia. Porém, possuir resquícios de outras obras não é o maior mérito de O Pagador de Promessas — nem tão pouco ter ganhado mais três prêmios internacionais. O grande trunfo de O Pagador de Promessas é contar a história do homem brasileiro sem deixar de ser um homem do mundo, daqueles que se vê em qualquer lugar: entre a cruz e a espada.

terça-feira, 22 de abril de 2008

Informação: o excesso e como mantê-la, na Wired

Dois bons artigos da Wired.

Um sobre o cérebro e seus mitos. Vale a pena ler as dicas sobre como mantê-lo "em dia": inclui ouvir música, fazer cruzadinhas e comer peixe.

A outra é sobre como a web 2.0 deixou de ser a panacéia para os problemas online e passou a ser a maior parte desses problemas: excesso de informação.

segunda-feira, 21 de abril de 2008

Feriado serve pra essas coisas

Nem só de viagem pro litoral ou shopping se faz o feriado do paulistano. Faz-se também de alegria por não ter de pegar trânsito, como deu pra sentir na vazia Av. Brasil, sentido Ibirapuera, nesta segunda.

Quando Vidas se Tornam Formas: Diálogo com o Futuro - Brasil/Japão


A minha primeira impressão foi a de que faltava propósito a tudo aquilo. É claro que estamos no ano do centenário da imigração japonesa e bla bla etc e tal. O que seriam, então, aqueles amontoados de plantas na primeira sala? Arte contemporânea? Vá lá... Isso só não pode ser desculpa pra achar relações onde nem existem.

Felizmente, ao fim da exposição a falta de propósito até foi suprida, mas ainda assim de maneira difusa, vaga.


Como pude ler em off (não, isso não existe), a exposição tenta mostrar as interfaces entre a arte moderna, pós-moderna e/ou contemperânea aqui do Brasil e do outro lado do mundo. Isso por vezes é até alcançado: a arte d'osgêmeos (onipresentes) lembra a toy art; o look da Isabela Capeto tem reminescências em Tóquio — até porque as "reminescências de Tóquio são a moda global.

O problema talvez tenha sido a disposição das obras e instalações — que jargão mais eng. civil. O caminho era confuso e por vezes não levava o espectador a imaginar os estreitamentos existentes entre o que se faz lá e o que se faz cá. Isso, de maneira alguma, joga a exposição no lixo. Algumas instalações são bem interessantes, como aquela que diz que "Pode causar vertigem", ou a colagem (se não for colagem, me perdoem) da Beatriz Milhazes.

Assim, fica a dica (não imperativa): vá. Comece pela sala 2 e passe pela sala 1.

* Mais fotos no flickr que agora há pouco resolveu não abrir.

Rave do eu sozinho e um pouco mais

Foto no flickr da lucy.aboytes

Aconteceu a
primeira rave sem música em Nova York. O evento, que já se realizou na Europa, ocorreu na Union Square. Uma multidão de jovens dançando com cada um escutando à playlist do seu iPod.

Não vá pensando que é só chegar e dançar. O negócio tem uma série de regrinhas para deixar a "vibe" mais coletiva possível. Pra muitos é algo retardado. Eu vejo mais como uma metáfora que todos os participantes compram. Com tudo cada vez mais individual a necessidade pelo outro recrudesce. Haja vista, por exemplo, o
coworking. Todo mundo quer se sentir mais social nesse mundo de metaverso.

* Pauta 2

E a Virada Cultural chegando, hein. presença confirmada no Mundo Livre SA, no Sick Sick Sinners, no Orquestra Imperial e no Ultraje a Rigor. Vai ter muito pano pra manga. E quem sabe algumas surpresas (boas, espero!)

* Pauta 3

O
Lúcio Ribeiro e seus rumores. Diz ele que podem aterrisar por aqui Joss Stone, Megadeth, Guns, Red Hot, Madonna — e isso é só o primeiro parágrafo.

Pelo sim — Overcoming Folk Trio na Virada vai tocar — e pelo não — Rage Against the Machine, como ele disse há um tempo — é bom economizar uma grana.

domingo, 20 de abril de 2008

Voltei, nem tão cedo, mas voltei!

Finalmente os brasilienses do Móveis vieram pra sampa e pisaram em solo Uspiano, cumprindo rumores de algum tempo atrás.

Movéis Coloniais de Acaju no Festival Alternativo da POLI - USP, dia 19 de abril.



Como diz o subtítulo, foi um festival. Das bandas que passaram, porém, eu estive presente no Motocontínuo, no duo freak Montage e a miscelânea do Móveis. Queria ter visto o Hurtmold e dedicarei mais espaço aqui para o Móveis Coloniais de Acaju.

No Motocontínuo eu só estive presente em corpo. O suficiente pra ouvir pouco da banda e alguns rumores não muito favoráveis ao som dos caras.

O Montage chamou a atenção e cumpriu a proposta. A sonzera eletrônica da dupla espantava quem não estivesse acostumado, mas não deixava de fazer as pernas se mexerem — e o movimento contido das pernas se multiplicava por mil pra galera "na vibe" da frente do palco.



Fico feliz por ter visto que o Cansei de Ser Sexy tem rendido algo aqui no Brasil também. Como disse o Lúcio Ribeiro, dá pra fazer um som no Brasil sem ter nada brasileiro impregnado. E isso não é no sentido pejorativo, não na leitura do impregnado. Talvez seja pejorativo pensar que a tal da globalização dos anos 90 não vai sumir mais — nesse caso cada um pensa como quer. No
last.fm, contudo, pediram Montage na Inglaterra. É o hype? E eu to com "I trust my (fuckin) dealer" na cabeça...

E vamos ao Móveis! O show mais esperado, sem dúvida. A espera tinha sido longa até então. As filas da cerveja faziam brotar pessoas e metros, a rotatividade do público já era alta e a demora começava a encher o saco. Os brasiliense, enfim, subiram ao palco.
Abriram com uns lados-B da banda (como assim? lado-B duma banda que nem tem Coletânea/Perfil! É o hype (?) ), mas não deixaram de empolgar lodo de início.


Os metais como a flauta e o sax foram comprometidos pela estrutura, não tinha jeito. Os caras são uma big band tocando num palco razoavelmente pequeno. O engenheiro de som fez milagre pro teclado aparecer junto dos trompetes, com um pouco de ajuda da acústica do local. Felizmente o resultado foi bom.

Onde estive pulularam bates-cabeça com tentativas mais afoitas de moshpit, nada que não fosse abortado. Quando tocaram Seria o Rolex a galera pulou como nem parecia na melancolia da letra — e da melodia, em parte: ninguém mais acha que lembra Unchain My Heart do Ray Charles? Falando em Ray, eles mandaram junto da galera um Hit the Road Jack, suave e bem levado.

Algumas músicas novas prometem. Não me recordo dos nomes, nem muito das músicas. O que tenho certeza é que elas continuam bem desenhadas, com a conversa sutil do sax-trompete e baixo-teclado, ao estilo Móveis Coloniais que vem se formando. Não esqueci também da solada do batera. Simples e entremeada pela pegada ska.
Os pontos altos foram deixados pro fim. O riff de Copacabana fez a galera cantar em uníssono. Apesar do som meio "sobreposto", a execução foi bem legal. Os instrumentistas desceram do palco e fizeram aquela coreografia com a galera. Impagável. Só quem esteve lá mesmo.

Móveis Coloniais de Acaju representaram a cena alternativa. Ou melhor, a cena da música como alternativa pra tanta coisa ruim que tem se ouvido. Pois é, alternativo é aquilo que se chamou underground por um tempo, agora se chama indie e depois sabe lá deus (ou alguma gravadora) o que vai ser.

sábado, 19 de abril de 2008

Primeiro, o Arnaldo.

Alguns bons shows a serem comentados e pouco tempo. O problema é achar que o tempo é pouco, mas isso é problema da sociedade contemporânea.
Enfim, o começo:

Analdo Antunes no Beco do Aprendiz, domingo passado (13 de abril).


O show era de graça (promovido pela
Eletrocooperativa) e aconteceu no Beco do Aprendiz, na Vila Madalena Madaloca Madá e variantes... O cenário felizmente foi propício para Arnaldo criar e recrear.

O músico caminhou bem a performance, sem chamegos ou aversões à platéia. També, pudera: ali todo mundo se conhece: o público, Arnaldo; Arnaldo, o público. Por mais que a frase ainda seja dita ("ele pode fazer qualquer coisa, cara, é o Arnaldo" o poeta-músico-cantor-artista se comunica e transforma cada um que vê o show.

Ele sabe até onde vai com suas poesias enquanto são feitos alguns ajustes. Sabe fazer o charminho pro pessoal pedir bis. Sabe mandar uma dancinha que muito me lembrou o Chico caranguejo de andada Science. Sabe satisfazer os pedidos da platéia (Lavar as Mãos, com trecho logo abaixo)

Arnaldo fez juz à sua persona camaleona ao tornar a apresentação tão aconchegante quanto o local — que por vezes não ajudava o timbre grave de sua voz. Seus músicos merecem atenção, (é claro) em especial o tecladista que "arranhou" na sanfona uma apresentação à parte, uma que agradaria o Rei do Baião ou um tiozinho do Leste Europeu.




*Detalhe que deve ser mencionado: os dois garotos nas grades no show. Os moleques tavam curtindo mais que ninguém, arriscando uns gritos e levando todas as músicas.
Nem tudo é Malu Magalhães — pedras sobre minha cabeça.

*A foto e o vídeo são do celular, dá um desconto!

* O show do Móveis Coloniais de Acaju fica pra mais cedo, quando eu acordar.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Mais que na hora de começar a postar!
Tá dito.